Teologia da prosperidade: O mercado da fé e a fé mercadológica

Por  Charles Manga - Fonte de pesquisa : O grande Conflito/ Dialogo de fé / Assim diz o Senhor

O nosso Deus não está acima de todos. Ele está no meio de nós manifestando ininterruptamente sua misericórdia para com todos
No século XIX, surgiu nos Estados Unidos uma corrente teológica cujo eixo central era a comercialização da fé cristã a partir da deturpação dos ensinamentos bíblicos. Como diferencial, defendia ardorosamente o acúmulo de riquezas materiais na terra. Estamos falando da Teologia da Prosperidade, identificada, também, como Movimento da Fé ou Confissão Positiva. Atualmente, a Teologia da Prosperidade se faz presente em todo o mundo, exaltando os privilégios que a riqueza e o dinheiro podem trazer, apresentando-os como “retribuição de Deus” aos fiéis que seguem sua doutrina, substituindo a fé e a devoção divinas por “prósperos empreendimentos”.   Doenças e sofrimentos, ao contrário, seriam frutos da falta de fé e de compromisso.


A Teologia da Prosperidade redefine o neopentecostalismo. Para alcançar seus objetivos, os responsáveis pela disseminação dos ideais da Teologia da Prosperidade, buscam arrebanhar o maior número possível de adeptos, uma vez que por “prósperos empreendimentos”, compreende-se a doação aos “ministérios”, “obras” ou igrejas. Pregadores muito bem preparados constroem e apresentam aos doadores uma analogia simples, porém convincente: ao assumirem o compromisso de se tornar um empreendedor a partir de uma primeira doação, o fiel estará plantando a semente da prosperidade. Mas é preciso cuidar dessa semente, regando e cultivando-a com novas doações. Com isso, estão dizendo aos seus seguidores que a responsabilidade pelo sucesso ou o fracasso de seu empreendimento, depende única e exclusivamente de sua fidelidade a Deus, manifestada através de sua fidelidade à “igreja”.

A TP que conhecemos hoje teve origem no século XX e se expandiu por todo o mundo através da mídia, alcançando Ásia, África e América Latina. Mas foi a partir da globalização, com a desregulamentação dos mercados e a remodelação do papel do Estado, que o paradigma da TP se intensificou e se disseminou como nunca antes. Aproveitando a dinâmica da reforma dos mercados o crescimento das desigualdades sociais geradas por ela, a TP arrebanhou adeptos convencendo-os a fazer doações financeiras em troca de prosperidade e bem-estar. Ao contrário do que muitos pensam, a Teologia da Prosperidade, não se originou na Europa, mas sim os Estados Unidos. A crença de que a TP teria surgido na Europa, baseia-se no fato de que, desde o século XVII, aquele continente vivia forte influência da doutrina calvinista – comprometida com os valores do trabalho e da acumulação de riquezas. Ao homem, cabia a tarefa de trabalhar arduamente para ampliar seu patrimônio, demonstrando sua coragem e fé. Já naquela época, pobreza e doenças eram vistos como frutos da falta de fé e coragem.


A crença no acúmulo de riqueza por meio do trabalho e do esforço faz parte da doutrina calvinista. Para alguns estudiosos e historiadores, a matriz religiosa de natureza calvinista teria influenciado e contribuído consideravelmente com o surgimento do trabalho forçado imposto aos mais pobres por toda a Europa ao longo do século XIX.
Em sua obra A ética protestante e o espírito do capitalismo, Max Weber (1864-1920) defende o acúmulo de riqueza por meio do trabalho e do esforço, -presente na doutrina calvinista-, como condição indispensável para uma vida feliz. Como uma abrangente visão da ética do trabalho na lógica da produção do capital.

Feito este esclarecimento, sigamos em frente. De acordo com Érico Tadeu Xavier – pastor da Igreja Adventista do Sétimo Dia –, o predecessor da Teologia da Prosperidade foi o pastor batista americano Essek William Kenyon (1867-1948). Curiosamente, Kenyon não apresentava nenhum conhecimento formal de teologia, tendo passado por várias congregações. Quando decidiu abandoná-las, passou a adotar formas distintas de interpretar a relação de Deus com os fiéis. Não tardou para que os ensinamentos de Kenyon ultrapassasse fronteiras. Foram vários os fatores que lhe permitiram divulgar suas ideias, mas o principal foi o desenvolvimento de empreendimentos milionários levados a cabo em nome da fé e amplamente noticiado pela mídia.

Através desse modus operandi, espaços foram se abrindo para que a TP na sociedade, especialmente nos meios que se colocavam –ainda que veladamente-, contrários aos ensinamentos e exigências cristãs que repelem o acúmulo de riquezas nas mãos de alguns em detrimento da miséria de milhares. A dinâmica da TP lhe permite reformular seu plano de ação de acordo com as mudanças ocasionadas pela sociedade consumista sempre que julgar necessário, sendo esta uma das principais características da fé de mercado.

Voltando à E. W. Kenyon, sabe-se que ele teria sido altamente influenciado por seitas metafísicas como Ciência da Mente, Ciência Cristã, Novo Pensamento. Esses movimentos ganharam projeção internacional ao disseminarem a ideia de que “tudo que dizemos se torna realidade”, realçando o “poder da mente”. Este “poder mental” preconiza que a fé em Jesus Cristo exige, obrigatoriamente, a busca pela riqueza material e a boa saúde. Toda falta ou enfraquecimento da fé provoca o surgimento da miséria e das doenças sendo esses, frutos do pecado. Todo sofrimento é interpretado como falta de fé. Segundo afirma Paulo Romeiro em sua obra Super Crentes, são várias as maneiras para se interpretar a ‘confissão positiva’.


Porém, a mais difundida e mais significativa, refere-se literalmente a “tornar existente tudo que declaramos e confessamos com nossa boca”, visto ser a fé uma confissão. Entretanto, foi o também americano Kenneth Erwin Hagin (1917-2003) o maior divulgador da Confissão Positiva;, sendo considerado o precursor do Movimento Palavra da Fé. Hagin tinha um defeito cardíaco congênito e leucemia. De acordo com seu próprio testemunho, Hagin afirmava ter sido visitado por Jesus Cristo e curado em 1933. Seu testemunho tornou-se a base de diversas pregações , onde ensinava “ser preciso declarar a cura antes de vê-la”. Hagin declarava que antes de sua cura, “parecia um morto vivo indo à escola e que muitas pessoas lhe aconselhavam não ir às aulas. Contudo, afirmava Hagin, como já havia levantado de um leito de morte contrariando a medicina da época, permanecia “declarando que estava curado”. Nesse sentido, é considerado precursor da Palavra da Fé. Hagin foi também um dos primeiros pastores protestantes a escrever sobre a diretrizes que se tornaram o fundamento do movimento carismático.

Na base de sua doutrina, estão, dentre outros elementos, a cura física: é vontade de Deus que um crente seja curado fisicamente; prosperidade financeira: é sempre vontade de Deus que cada um seja financeiramente abençoado por meio da fé; fé e autoridade: Hagin acreditava que o crente, através da sua posição em Cristo, tinha autoridade sobre os elementos deste mundo e do mundo satânico. Pela fé, o crente pode exercer a autoridade de Deus para mudar situações impossíveis (Mc 11, 22-24). Fé é uma questão de crença na palavra de Deus, que implica uma expressão vocal de sua vontade e a confissão da mesma.

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